Muito bem, vamos dar então início
à nossa primeira aula.
O primeiro tema da Universidade de
Verão 2011, como sabem, intitula-se "Ambiente e Energia, o que temos de decidir
já.” Connosco temos o Eng. Jorge Moreira da Silva, que foi presidente da JSD.
Consta, aliás, um texto dele no
livro das Histórias da JSD que a pedido do Duarte Marques incluímos na vossa
pasta, um livro que foi coordenado pelo Paulo Colaço.
O nosso convidado é
Vice-Presidente da Comissão Nacional do PSD, foi sucessor do Dr. Pedro Passos Coelho
na presidência da JSD. Foi Vice-Presidente na JSD e agora é no PSD. Foi um
deputado europeu notável - foi meu colega pelo que não é por terceiras pessoas
que o digo, é por testemunho directo. Foi o responsável no Parlamento Europeu
por todos os dossiers relacionados com as Mudanças Climáticas.
Está actualmente num cargo de
grande responsabilidade nas Nações Unidas e já foi orador desta Universidade de
Verão várias vezes, em três edições, esta é a quarta vez que o Eng. Jorge
Moreira da Silva está na UV. Agradeço-lhe muito a sua presença.
O nosso convidado tem como hobby o ténis, os livros e a música. Tem
como comida preferida a feijoada (oque é bom para quem está a fazer dieta);
[RISOS]
o animal preferido é o cão (animal
mais votado pelos nossos convidados); o livro que nos sugere é "Se isto é um
homem” de Primo Levi; o filme que nos sugere "Les Amants du Pont-Neuf”; e a
qualidade que mais aprecia é a defesa para o interesse comum.
Na primeira aula da UV 2011, o
Eng. Jorge Moreira da Silva.
[APLAUSOS]
Jorge Moreira da Silva
Muito obrigado. Eu não tinha a
noção que esta era a aula inaugural. Aumenta a minha responsabilidade. É sempre
um gosto voltar a esta Universidade de Verão. Eu vinha com o meu colega da
Comissão Política Nacional, o Dr. Vasco Pinto Leite, e dizia-lhe que esta era a
actividade do partido na qual eu tinha mais prazer em participar ao longo
destes vários anos, porque sistematicamente tinha à minha frente, ao longo
destas várias edições, a garantia em como o Partido tem um futuro sustentável.
Mas não posso deixar de repetir
aquilo que digo sempre que participo nestas sessões: é que isto se deve não só
ao modelo como também, e em larga medida, ao vosso Reitor. Os modelos
funcionam, mas não dispensam a liderança e o facto de o eurodeputado Carlos
Coelho ter definido o modelo e ser coordenador desse modelo tem feito desta
Universidade de Verão um caso notável, não apenas em Portugal, mas até no
contexto europeu. Portanto, eu quero desejar-vos um bom trabalho e, mais uma
vez, ao deputado europeu Carlos Coelho, que tem feito um trabalho notável à
frente das suas várias edições.
Bom, eu combinei com ele que
apenas focaria a questão das alterações climáticas e da Energia na minha
intervenção inicial. Porquê? Porque esse é o facto que temos de decidir já. Se
eu tiver que encontrar/escolher uma área em que temos de actuar com liderança,
com sentido estratégico e com sentido de urgência é a área das alterações
climáticas, isto no contexto do Ambiente e da Energia. Portanto, nesta intervenção
inicial vou tratar essencialmente das questões das mudanças climáticas e do
desenvolvimento de baixo carbono e depois podemos falar dos outros temas de
Ambiente nas perguntas e respostas, até porque costuma ser a parte mais
interessante nestas sessões.
Nós tivemos, há três dias, um
fenómeno climático extremo na Costa Leste dos Estados Unidos, o furacão Irene,
e está em preparação, pelo que se percebe, um outro furacão, o furacão José.
Qual é a novidade? A novidade está em que é raro o surgimento de fenómenos
desse tipo no Atlântico Norte. Estes fenómenos são tradicionais desta época, as
tempestades tropicais, mas o que não é normal é que ocorram na Costa Leste, a
Norte. Este é dos efeitos que os cientistas atribuem à mudança climática
causada por nós. O aquecimento global, o efeito de estufa, tem consequências
que os cientistas conseguem identificar para as próximas décadas, para o
próximo século, mas que também já estão a ser vividas hoje.
Durante muito tempo, a dúvida era
saber se alguns fenómenos climáticos que estamos a viver poderiam ser imputados
às condições normais da nossa meteorologia ou climatologia, ou já se podiam
atribuir ao efeito de estufa – eu agora vou dizer um palavrão – antropogénico,
isto é, o efeito de estufa causado pelas emissões de gases de efeito de estufa
entre os quais o CO2. Ora, então, o que o painel intergovernamental
para as condições climáticas concluiu, há poucos anos atrás, é que não é apenas
verdade que vamos sofrer consequências sérias nas próximas décadas em função do
nosso modelo de produção e consumo que gere emissões, como também é verdade que
as alterações do clima dos últimos vinte anos – alterações de precipitação,
alterações da localização dos fenómenos climáticos extremos, alteração a nível
da temperatura – que essas alterações já são da nossa conta, já fazem parte da
nossa responsabilidade.
Se olharem para este gráfico, em
especial para o do lado direito percebe-se que esta é a fita da temperatura
onde se atribuem consequências da mudança climática diferentes, em função do
aumento da temperatura. Se o aumento da temperatura for de 1 grau há alterações
previstas a nível da Água, dos Ecossistemas, da Saúde, da Biodiversidade; se
forem 2, há outras alterações; 3, por aí adiante.
O que está previsto – se não fizermos
nada – é que a mudança climática, ou o aumento da temperatura pode ir, até ao
final do século, a 4 graus centígrados, em relação ao período pré-industrial
(1750). Dirá, bom, mas 4 graus é uma alteração pequena, mas convém ver que
estamos a falar de 4 graus em média, o que significa que em algumas partes do
planeta não serão apenas 4 graus, serão muito mais do que 4 graus e, por outro
lado, convém notar que o último período glaciar – nós estamos a viver um
período interglaciar – a temperatura média no planeta era apenas 5 graus mais
baixa do que é hoje. E recordo aquilo que aconteceu no último período glaciar:
a ausência completa de viabilidade de vida humana e de viabilidade muito
limitada ao nível das espécies de Fauna e de Flora, logo, 5 graus abaixo ou 5
graus acima faz toda a diferença. Portanto, pensarmos que a temperatura no
planeta pode aumentar 4 graus centígrados até ao final deste século, que o
nível do mar pode aumentar até 88 cms em média até ao final deste século,
produzirá alterações em larga escala sobre a Saúde, os sistemas costeiros, a
Alimentação, os Ecossistemas, sobre a Água, e isso infelizmente não se vai
sentir de uma forma democrática. O que é que eu quero dizer? Infelizmente, as
consequências das alterações climáticas far-se-ão sentir mais naqueles que já
são hoje os mais vulneráveis e os que são hoje já os mais pobres e nas regiões
que nem sequer são as que emitem mais gases de estufa.
Portanto, aí é o gráfico do lado
esquerdo: reparem que é no continente africano e no sudoeste asiático que se
vão sentir as maiores consequências das alterações climáticas e é precisamente
nessas regiões que as emissões dos gases com efeito de estufa são mais baixas.
Há aqui um problema, se quiserem, de fita do tempo que é as decisões para as
próximas gerações ou são tomadas agora ou será tarde demais. Está aqui um
problema de compatibilidade entre os círculos políticos, os círculos de decisão
e os círculos de impacto dessas medidas, estamos no fundo a tomar decisões hoje
única e exclusiva mente a pensar em mitigar os efeitos da mudança climática
para muitas décadas, mas se não fizermos agora, too late. Em segundo lugar, há um paradoxo que não é temporal, mas
geográfico: é precisamente nas regiões que menos emitem que as consequências
serão mais graves, o que significa que é necessário encontrar uma resposta
global. E foi por isso que começou o Protocolo de Quioto.
A primeira resposta a este
problema global – a mudança climática – nasceu da Conferência do Rio em 1992,
mas só teve tradução prática em 1997 com a Cimeira de Quioto onde se fixaram
metas para os países industrializados: uma meta de redução de 5% até 2012 face
a 1990. Porquê só para os países industrializados? Por aquilo que eu disse há
pouco: os países em desenvolvimento são aqueles que serão mais afectados. Nesta
fase são aqueles que menos emitem, portanto numa primeira fase os países
industrializados tinham de assumir a liderança. Porém, o Protocolo de Quioto
tinha um conjunto de pilares para a concretização dessas metas que, para além das
políticas domésticas - aquilo que os Estados têm de fazer para reduzir as suas
emissões, introduziu três mecanismos de mercado: o comércio de emissões (que eu
mais à frente irei referir com maior pormenor), o mecanismo de desenvolvimento
limpo e a implementação conjunta.
O mecanismo de desenvolvimento
limpo, como é que funciona? Um país em vias de desenvolvimento, por exemplo,
Moçambique, que não está no Protocolo de Quioto com metas vinculativas de
redução das emissões, não está obrigado a reduzir as emissões, tem um incentivo
para se desenvolver de uma forma mais limpa por via deste mecanismo de mercado,
porquê? Porque, por exemplo, uma central eólica, uma instalação solar, uma
reconversão nos equipamentos de combustão, substituindo os geradores (como sabem
em muitos países em desenvolvimento a produção de energia vem ainda a partir de
geradores altamente poluentes) por fontes de energia renovável baixa as
emissões e essa redução de emissões gera créditos de carbono para a empresa ou
para o Estado que concretize esse projecto. Esses créditos depois podem ser
vendidos aos países industrializados que necessitam deles para abaterem na sua
conta.
Dando um exemplo prático: a EDP
está no comércio europeu de direito de emissões e tem um tecto anual para todas
as suas instalações de, por exemplo, 2 Megawatts (um exemplo apenas) e tem de
cumprir todos os anos esses 2 Megawatts numa determinada instalação numa
central a carvão ou a gás natural; para cumprir essa meta pode fazê-lo
reduzindo as suas próprias emissões por acções domésticas ou investindo em
projectos em Moçambique, Angola, Bangladesh, na Índia, na China, recebendo
créditos de carbono e com esses créditos de carbono abate à sua conta
doméstica, à sua conta nacional de emissões. Dessa forma ganha-se nos países
industrializados, porque uma parte das suas obrigações de redução das emissões,
só uma pequena parte, mas ainda assim importante, pode ser feita a partir de
investimentos no exterior, e ganham os países em vias de desenvolvimento que
recebem investimentos em projectos "limpos” através de financiamento através de
países industrializados e isto é a base da Economia do Carbono.
A Economia do Carbono é criada a
partir de uma meta global para as alterações climáticas de reduções de emissões
– meta que está atribuída à escala global, mas depois a cada um dos Estados e
cada um deles tem de cumprir essa meta através de medidas domésticas, mas
também podendo comercializar emissões com outros Estados ou investindo em
países em vias de desenvolvimento. Hoje o mercado do carbono já tem um volume
muito significativo, já representa em dólares praticamente 150 mil milhões
anuais de transacção no mercado do carbono. Estamos a falar de um mercado com
muito significado: 90% deste mercado é o sistema europeu de comércio de
emissões. Eu aqui gostava de explicar um bocadinho melhor o que isto é.
Eu estou muito ligado a esse
sistema. Fui, enquanto deputado europeu, o autor dessa directiva em 2003, que
faz o seguinte: para além dos Estados que têm emissões, também as empresas têm
obrigações de contenção das suas emissões. O que é que a Europa fez? Em vez de
dizer que Portugal, França, Espanha, por aí adiante, fazem única e
exclusivamente o que quiserem, à escala nacional, com políticas domésticas,
fizeram as contas e chegou-se à conclusão que é mais barato ter políticas
comuns e coordenadas para as alterações climáticas, na Europa, através de um
sistema que é este comércio que cobre metade de todas as emissões europeias.
Metade das emissões europeias está dentro desta bolha europeia de comércio de
emissões. Quem é que está dentro da bolha? Estão as empresas do sector da
energia, da produção de electricidade, o sector industrial como o cimento, o
papel, a metalo-mecânica, o sector químico agora também, com o vidro e a cerâmica
– os sectores de produção de energia e de consumo de energia mais intensivos
estão todos cobertos por este sistema de comércio de emissões.
No fundo este sistema ultrapassa a
própria dimensão nacional porque nele estão 15 mil empresas europeias que concentram
nelas metade de todas as emissões e cria-se um tecto anual de emissões para
estas empresas, um tecto que é uma bolha (se quiserem) de CO2 que é
decrescente: todos os anos essa bolha tem de ser mais pequena, há um objectivo
ambiental que é imposto, mas a forma de atingir esse objectivo é da forma mais
eficiente. Porquê? Porque dentro desta bolha estão empresas que têm um direito
a poluir, uma determinada quota de poluição, como eu disse há pouco os tais
dois milhões, ou um milhão ou meio milhão de toneladas, e a empresa toma uma de
duas decisões.
Ela sabe que no final de todos os
anos tem que entregar à Comissão Europeia, através de um registo electrónico,
uma quantidade de licenças de emissão que é igual às suas emissões anuais. Se a
empresa tiver mais emissões que as suas licenças, terá de ir comprar ao
mercado; se tiver menos emissões do que a sua licença de poluição, pode ir
vender ao mercado. O que é que a empresa faz? Uma análise, que é esta: se for
mais barato concretizar um projecto "limpo” dentro da empresa para reduzir as
emissões, se for mais barato que o mercado, ela reduz as emissões; se for mais
caro do que o valor da tonelada no mercado, adia esse investimento e vai ao
mercado comprar as emissões que faltam, reduzindo as emissões mais tarde. Qual
é a vantagem? É que a bolha europeia, a meta ambiental, é decrescente, todos os
anos a bolha vai decrescendo, mas dentro da bolha a decisão de redução das
emissões é assente em critérios económicos.
No fundo, com este sistema
consegue-se baixar o custo do cumprimento da meta ambiental em cerca de 30% a
40%, comparado com o que havia se não houvesse este sistema. Este sistema é tal
forma importante que já gera em transacções anuais cerca de 100 mil milhões de
euros e é considerado hoje o padrão para aquilo que os Estados Unidos, a
Austrália, a Nova Zelândia, a própria China, está a pensar fazer, portanto no
futuro teremos cada vez mais sistemas de comércio de emissões.
Bom, o CDM, o Mecanismo de
Desenvolvimento Limpo que permite países em vias de desenvolvimento recebam
projectos "limpos” e com isso geram créditos, é um sistema muito importante
para esses países, mas ao mesmo tempo muito injusto. Reparem, em apenas 5
países – Brasil, Índia, China, México e Coreia do Sul – concentram-se 80% de
todos os créditos de carbono que foram gerados. Portanto, tudo o que é projecto
"limpo”, que é investido nesses países em desenvolvimento, gera créditos de
carbono (como vos disse há pouco), que são vendidos no mercado europeu ou no
mercado internacional. Infelizmente, em apenas 5 países e concentra 80% desses
projectos e não é nesses países que mais necessidade existe de capacitação e
investimento porque a Índia, China, Brasil, México e Coreia do Sul são países
que já têm outras alavancas económicas para poder descarbonizar o seu modelo de
desenvolvimento. Portanto, há aqui um primeiro problema que a Economia do
Carbono tem de resolver.
Peço-vos desculpa novamente, eu
vou passar alguns slides mais depressa senão não consigo chegar ao fim, mas eu
neste primeiro conjunto de slides quis dizer-vos qual é o problema das
alterações climáticas, qual foi a primeira resposta, através do Protocolo de
Quioto e como é que a Economia do Carbono está a conseguir com que um objectivo
ambiental esteja a ser cumprido do ponto de vista económico com os melhores
resultados. Mas há aqui também alguns problemas, há um desequilíbrio geográfico
mas houve também um segundo problema: o Protocolo de Quioto nasceu em 92, é
assinado em 98, ainda com os Estados Unidos, começa a ratificação em 98, as
negociações sobre 5 artigos do Protocolo de Quioto arrastam-se até 2003 e só em
2005 é que o Protocolo de Quioto entrou em vigor, porque só nessa altura se
conseguiu encontrar um número de assinaturas suficientes para ele entrar em
vigor. Reparem, perdeu-se 13 anos para aquele que é o maior desafio ambiental
que a Humanidade tem pela frente e dos maiores desafios económicos. Perderam-se
13 anos em negociações para aquilo que é apenas um passo de bebé para aquilo
que nós necessitamos, porque o Protocolo de Quioto prevê apenas uma redução de
5% do que nós precisamos e se para esses 5% perderam 13 anos com negociações e
recuos facilmente se percebe que agora que estamos na fase de negociação do
sucessor do Protocolo de Quioto – aquele que vai vigorar para depois de 2012 e
que ainda não está desenhado, ainda não há um acordo sobre isso –, percebe-se
que temos um ponto de vista político e do ponto de vista diplomático um resto
de ano de 2011 e o ano de 2012 muito difíceis se quisermos ir a tempo de ter um
sucessor do Protocolo de Quioto.
Bom, que é que a Europa fez do
ponto de vista doméstico? Aquilo que já vos falei: o sistema de comércio
europeu, as políticas domésticas, as directivas das renováveis, mas há um
segundo fôlego que foi lançado por parte da Europa que foi assumir uma política
integrada a alterações climáticas e de energia e é a primeira vez que isto
acontece. Considera-se que as alterações climáticas é um problema de tal forma
determinante para a política energética e a política energética é de tal forma
determinante para as alterações climáticas, que não há alternativa senão
integrar estas questões do Ambiente e da Energia e foi o que a Comissão
Europeia fez, liderada por Durão Barroso, quando apresentou um pacote integrado
de novas directivas e novas metas para Energia e alterações climáticas
conhecido pelo Pacote 20-20-20, que é 20% de redução de emissão até 2020, 20%
de Energias Renováveis até 2020 e 20% de redução de consumo de energia até
2020.
Este gráfico é interessante porque
permite ver qual é a realidade nacional neste pacote europeu. Os países tiveram
– num momento em que se fala tanto do papel das Energias Renováveis, tanto em
Portugal como nos outros Estados europeus – o acordo que se alcançou na Europa
passou pelo seguinte: os países têm uma determinada meta para redução das suas
emissões, mas a sua meta pode ser menos exigente se esse país for mais
ambicioso nas renováveis, portanto essa foi a equação que se desenhou, e o
oposto: um país pode preferir não apostar tanto nas renováveis, mas para isso
tem de assumir uma meta nas reduções maior.
Portugal tem uma meta para os
sectores que não estão no comércio de emissões. O comércio de emissões, como
vos disse, é uma conversa à parte, é como se os países não entrassem nessa
metade das emissões, portanto metade das nossas emissões portuguesas e europeias
estão nos comércio de emissões e esse sistema tem metas de redução muito mais
ambiciosas até 2020 do que as que já existem hoje, mas na outra metade, que é
onde existe, se quiserem, a decisão nacional das políticas nacionais, Portugal
teve direito de aumentar as suas emissões até 2020 em 1% porque aceitou uma
meta de Energias Renováveis de 31%. Portanto, a média europeia é 20%, nós
aceitamos 31% de renováveis e dessa forma não tivemos de ir tão longe, quanto
outros, na meta de redução para os sectores que não estão no comércio de
emissões. Portanto, se alguém quiser baixar, em Portugal ou noutro país
europeu, a sua meta das renováveis isso não se faz de borla, é preciso ir
depois à meta de redução de emissões, renegociar e aceitar uma meta de redução das
emissões muito maior.
Dizendo de uma forma muito
simples: se Portugal decidir que quer rever a sua meta das renováveis, em vez
de 31% quer ter 20% de renováveis, então vai ter de aceitar metas de redução
das emissões nos Transportes, na Indústria, na Habitação, muito superiores à
meta de 1% que está definida. Portante, não é possível ter as duas coisas. Isto
é muito significativo numa altura em que todos os países fazem o debate sobre o
papel das Energias Renováveis. Neste momento, a Europa já está a pensar em
avançar unilateralmente para uma meta de 30%. É óbvio que uma das razões é
Ambiental. A Europa que já assumiu uma meta de redução de 20% não quer perder a
liderança e quer ir mais longe assumindo uma meta de redução de 30% porque isso
credibiliza a posição europeia agora para as negociações internacionais, como
também tem vantagens ambientais, mas a razão essencial para a decisão que está
neste momento a ser ponderada em Bruxelas – já está no Parlamento Europeu que
fez uma primeira votação sobre isto em cima da proposta da Comissão Europeia –
é a razão económica. Por isso escolhi este tema para esta nossa intervenção
inicial, porque se mistura no tema das alterações climáticas e cada vez mais se
confluem questões de Ciência, Economia, Energia e Inovação.
Ora, a Europa porque é que quer ir
agora para a meta de 30%, quando ainda por cima não há uma negociação
internacional? Porque percebeu que se não fizer isso, vai perder em termos de
Inovação em "tecnologias limpas”. Porquê? Como houve uma crise económica, que
ainda estamos a viver, as emissões caíram. Portanto, aquele objectivo de
redução das emissões para 2020 vai ser alcançado muito mais facilmente do que
estava previsto. Logo, se as emissões baixaram por causa da crise económica as
empresas do comércio de emissões – do ponto de vista técnico, se algumas das
coisas que estou a dizer não forem tão clara posso depois clarificar melhor nas
perguntas e respostas – mas imaginem que vocês são uma empresa que estão no
comércio de emissões, receberam licenças de emissão até 2012, mas o que a
directiva diz é que se não utilizarem podem bancá-las e usá-las no período
seguinte de 2012 até 2020, que é onde a coisa vai doer mais porque as metas vão
ser mais ambiciosas. Ora, como houve uma crise económica que afectou a Europa
as empresas do sistema de comércio de emissões, de repente, ficaram com menos
emissões, nalguns casos, do que as suas próprias licenças, logo, ficaram com
licenças a mais na mão. O preço da tonelada de carbono baixou – é o mercado a
funcionar, é assim que tem de funcionar –, não haveria nenhum problema mas este
sistema permite que se banque para o próximo período. Portanto, "eu vou guardar
estas licenças para quando, a seguir, ficar mais duro eu possa usar estas
licenças”.
Ora, se eu fizer isso, a tonelada
de carbono vai custar em média, não os 36 euros que estava previsto, mas 17
euros. Isso é mau? Para as empresas não é mau, porque se para cumprir metas
mais ambiciosas a tonelada de carbono, se eu precisar de ir ao mercado é mais
baixo, para mim empresa que tenho a obrigação de redução de emissões não é mau,
é bom, mas para a Inovação europeia é mau. Porquê? Porque com a tonelada de
carbono a 36 ou a 40 euros, o que é que acontece? Penetram mais facilmente as
tecnologias mais "limpas”. É criado um incentivo para que as empresas que
emitem menos possam ter uma viabilidade económica maior no mercado. Se a
tonelada de carbono afinal vai ficar a 16 euros, essas tecnologias mais
"limpas”, a política de Inovação, a política de Investigação, não vai ter um
incentivo económico, logo a Índia e a China que hoje já estão no top 10 e
nalgumas áreas no top 5 de tecnologias limpas como o fotovoltaico e o eólico,
podem ultrapassar a Europa porque a Europa perdeu aquilo que era o seu ganho de
pioneiro porque deixou de ter um incentivo económico adequado através do preço
do carbono. É por isso que a Europa agora está a pensar em alterar a sua meta
de emissões que já era ambiciosa, de 20 para 30%, para quê? Para cancelar
algumas licenças de emissão e, dessa forma, volta a haver uma escassez de
licenças no mercado, a tonelada dispara para os 36 ou 40 euros e, assim, há um
incentivo para a investigação que se faz nas renováveis, na eficiência
energética, na mobilidade sustentável, que possa ter viabilidade económica.
Reparem como de repente a política
de Inovação europeia encontra nas metas das alterações climáticas o seu
incentivo mais importante para os próximos tempos.
O que é que nós temos agora pela
frente para o pós-2012? O que é que temos que decidir para o sucessor do
Protocolo de Quioto? Temos que encontrar uma solução de redução das emissões
que preencha alguns requisitos: um requisito de responsabilidade que é "qual é
a meta global de redução das emissões se nós quisermos que a temperatura no
planeta não aumente mais do que 2 graus centígrados em relação ao período
pré-industrial?”. Pomos a concentração em 450 partes por milhão de CO2, 550
partes, 300 partes por milhão? Esta é a parte fundamental: responsabilidade.
Segundo é: como é que vamos compatibilizar esta ambição com a solidariedade?
Como é que podemos envolver os países em via de desenvolvimento neste esforço
de redução das emissões sem ao mesmo tempo limitar as legítimas aspirações que
têm ao desenvolvimento?
Esse é um debate apaixonante, é a
área onde trabalho. Eu trabalho no programa das Nações Unidas para o
Desenvolvimento e o prazer e o gosto que tenho é precisamente porque um dos
grandes desafios que hoje o Mundo global tem é o de encontrar os incentivos
económicos e as decisões do ponto de vista político e diplomático que assegurem
que esses países conseguem entrar numa trajectória de desenvolvimento de baixo
carbono. Isto é, que se conseguem desenvolver sem cometer os mesmos erros que
nós cometemos, que foi o de basearmos o nosso crescimento na Economia do fogo
que é a Economia da combustão, queimando os combustíveis fósseis. Mas é fazer
isto de uma forma que não limite as suas aspirações legítimas ao
desenvolvimento. Porquê? Porque isto é muito bonito – as questões ambientais
são fundamentais – mas não convém esquecermos que há mil milhões de cidadãos em
situação de pobreza extrema e dois mil milhões de pessoas sem acesso a
electricidade. Dois mil milhões!
Quando muitas vezes oiço na Europa e vejo o
dedo acusador virado contra os países em vias de desenvolvimento, dizendo que
isto do Protocolo de Quioto não serve porque isto só está a limitar a vida dos
países industrializados quando estes países em vias de desenvolvimento estão a
fazer crescer as suas emissões de uma forma descontrolada, é altura de limitar
as emissões nesses países em vias de desenvolvimento. Bom, isto é falácia,
porque se esquece que esses países de facto estão a fazer crescer as suas
emissões num ritmo muito mais elevado do que os países industrializados, mas
esquecem-se que nesses países ainda há dois mil milhões de pessoas que nem
sequer têm electricidade. Não é saber se a electricidade é verde, é branca, é
cinzenta, é preta, é que não há electricidade; e que há mil milhões de cidadãos
em situação de pobreza extrema e que há quase cerca de dois mil milhões sem
acesso a água potável.
Portanto, este é um dos grandes
desafios sobre o debate agora do sucessor do Protocolo de Quioto: é saber como
é que compatibilizámos Ambição com Solidariedade.
Finalmente, Custo e Eficiência. De
que forma é que estes grandes objectivos ambientais – que isto agora vai ser a
doer com metas muito ambiciosas – se podem concretizar ao mais baixo custo
possível, como é que podemos reformar o mercado de carbono para o tornar mais
eficiente. Esta é a grande dificuldade nas negociações: é que se é verdade que
os países em vias de desenvolvimento vão ultrapassar (estão quase a
ultrapassar) os países industrializados no Consumo de Energia, portanto, vão
consumir mais Energia (estamos a um ano que isso aconteça) do que os países
industrializados e se é verdade também que a China hoje já emite mais CO2que os Estados Unidos, não é menos verdade aquilo que eu vos disse há pouco,
que há pobreza extrema ainda nesses países em desenvolvimento e por outro lado
que as emissões per capita são muito
mais baixas do que a Europa ou os Estados Unidos. Esse é o gráfico do lado
direito em que têm bolha global de emissões na China, nos Estados Unidos, na
Índia, por aí adiante, depois têm as emissões per capita e estas na China são menos que um quinto do que as
emissões nos Estados Unidos. Portanto, é necessário, se é verdade que hoje a
China já tem mais emissões que os Estados Unidos, não é menos verdade que há
ainda situações de pobreza extrema da China e que as emissões per capita são muito mais baixas do que
nos Estados Unidos, logo é necessário encontrar aqui modelos de
responsabilidade comuns mas diferenciadas. Esse é, se quiserem, o jargão
técnico das negociações.
Primeiro, o objectivo é o da meta.
Qual é a meta que nós vamos assumir para o final do século em termos de
concentração das emissões. Os cientistas fazem esquemas deste género mostrando
graus de probabilidade, dizendo que se nós quisermos ter um aumento da
temperatura de apenas 2 graus centígrados em relação a 1750 e se quisermos ter
50% de chance que isso aconteça,
temos de colocar a concentração de emissões nas 450 partes por milhão. Ora, nós
hoje já estamos nas 425 partes por milhão, portanto estamos quase lá. Muitos
consideram este objectivo muito ambicioso. Pois é, mas este objectivo é
ambicioso em relação à vida que temos, mas só nos garante 50% da probabilidade
de que vamos atingir o tal objectivo de 2 graus centígrados, porque se
quisermos ter certeza maior temos que assumir concentrações de emissões ainda
mais baixas, o que é do ponto de vista económico e de adaptação do nosso modelo
de organização e de Sociedade muito mais difícil. Logo, nós para estas
negociações, as decisões críticas são cinco ou seis. Primeira decisão que é:
qual é a trajectória, o que vamos fazer até 2020 e até 2050? O que dizem todos
os estudos é que o que fizermos nos próximos 10 anos, vai ser mais importante
do que o que fizermos nos 30 seguintes. Porque embora a meta global, que toda a
gente aceita, que é a mais fácil, que é a meta de 2050 - já toda a gente
aceitou que vamos ter de reduzir as emissões em 50% à escala global em média
até 2050, aceitou porque esta meta fica lá para a frente -, mas nós só
conseguimos limitar o tal aumento da temperatura a 2 graus centígrados se
aproveitarmos os próximos 10 anos, porque o planeta tem a Inércia e é como se
fosse um camião muito pesado, se vocês travarem (o camião vai a grande
velocidade), ele com o peso que tem não pára imediatamente, ainda percorre
alguns centímetros ou alguns metros. O planeta é igual: se desligarmos tudo,
luzes, pararmos os automóveis todos, fecharmos toda a Indústria, mesmo assim
vamos sentir efeitos da mudança climática nas próximas décadas.
Logo, se nós não formos capazes de
assumir metas de redução das emissões de 25 a 40% nos países industrializados
até 2020 e nos países em desenvolvimento permitir que eles possam atingir o
pico em 2020 e não mais tarde que isso. Se nós não fizermos isso, se não
impusermos metas muito ambiciosas até 2020 para países industrializados e metas
de desvio de tendência do crescimento exponencial das emissões nesses países em
vias de desenvolvimento, podem esquecer o objectivo de 2 graus centígrados. No
fundo temos menos de 120 meses, menos que isso, para assumir a liderança em
relação a um debate e a uma política sobre a qual nós um dia vamos ter de
responder. Há uma geração a seguir à vossa que vos vai perguntar se, perante
todos os dados que tinham ao vosso dispor, fizeram aquilo que podiam e aquilo
que deviam. Hoje os dados científicos demonstram – e a seguir falarei do ponto
de vista económico – que temos todas as condições e informações para mudarmos
de vida rapidamente e que não o fizermos pomos em causa a qualidade de vida das
próximas gerações.
Segunda questão: financiamento.
Muito bem, os países em vias de desenvolvimento precisam de dinheiro para se
adaptarem a esta nova vida de baixo carbono. Porquê? Porque se nós estamos a
dizer a estes países em vias de desenvolvimento que vão ter de se desviar do
seu crescimento exponencial das emissões, da sua tendência, vamos ter de
financiar acções de redução das emissões e financiar a adaptação às alterações
climáticas. Isto é, aquelas actividades que são indispensáveis para fazer face
a alterações climáticas que já não são mitigáveis, que são inexoráveis. Nos
próximos dez anos os fenómenos climáticos na Europa, nomeadamente na Península
Ibérica, vão-se intensificar, vamos ter mais seca severa e extrema, mais
prolongada e mais intensa, mas pior do que isso é em África e no Sudoeste
asiático.
Logo, há uma parte das alterações
climáticas que precisa de adaptação: nos sistemas costeiros, nos sistemas de
irrigação, nos sistemas de protecção civil; logo, há necessidade de
financiamento. Feitas as contas, chega-se à conclusão que, tudo somado, os
países em desenvolvimento precisam de 250 mil milhões – em notação
anglo-saxónica são 250 biliões, mas para a nossa notação são 250 mil milhões de
dólares – que precisamos para o apoio de que estes países precisam até 2020.
Em Copenhaga e depois em Cancun,
os países industrializados já se comprometeram em atribuir 100 mil milhões de
dólares até 2020 aos países em desenvolvimento para alterações climáticas. Para
perceberem de que números estamos a falar: a ajuda do desenvolvimento hoje, a
ajuda tradicional para Saúde, Educação, combate à pobreza, tudo somado, a ajuda
anual ao desenvolvimento são 106 mil milhões de dólares. O que estamos a dizer
é que vamos ter de duplicar a ajuda do desenvolvimento e que metade disso é
para alterações climáticas; isto para ver que a questão da alteração climática
é hoje central na agenda internacional e na agenda da cooperação e do
desenvolvimento.
O terceiro desafio – eu vou passar
rapidamente – é construir um mercado global de carbono, é no fundo aquilo que
existe na Europa, tentar expandi-lo, haver cada vez mais sistemas de comércio
de emissões, nos Estados Unidos, na Austrália, na Nova Zelândia, no Japão e
depois conseguir interligar esses sistemas para que as empresas portuguesas,
espanholas, para que elas possam depois comercializar emissões com empresas que
estão na Índia, na China, nos Estados Unidos, por aí adiante. Por isso, baixa o
preço de cumprimento do objectivo ambiental.
Quarto objectivo é a adaptação, de
que já vos falei. É encontrar financiamento para a mudança climática que já não
é ultrapassável, que já não é passível de ser travada.
Quinto lugar: deflorestação.
Gostamos de ligar as questões das alterações climáticas e do Ambiente à
Tecnologia apenas; renováveis e etc. Ora, há uma área que não é tecnológica,
que passa pela alteração de políticas e comportamentos que é a área florestal
que hoje é responsável por 20% das emissões globais. A deflorestação,
nomeadamente a floresta tropical, é responsável por 20% de todas as emissões.
No fundo, sabem, a floresta é um sumidouro de carbono, absorve o CO2.
Se estamos a desflorestar, se estamos a degradar a floresta, isso está a
aumentar as emissões, logo, a política florestal é mais central do que a
política de inovação tecnológica em áreas como a Energia, para travarmos a
mudança climática.
Finalmente, é necessário envolver
as comunidades locais nisto. O Protocolo de Quioto está muito pensado de uma
forma global e nacional, mas se nós pensarmos que uma boa parte do consumo e da
energia se faz a nível local e se por outro lado pensarmos que 50% do custo da
água é electricidade e 50% da electricidade já vem da água, percebe-se que não
faz sentido, por um lado, pensar em redução de emissões, e por outro, pensar em
adaptação na área da água, sem interligarmos as duas áreas. Por outro lado não
faz sentido pensar em alterações climáticas à escala global e à escala nacional
sem pensar no envolvimento das comunidades locais e regionais. Portanto há aqui
uma mudança de paradigma que é necessária.
Bom, vamos fazer contas: o que nos
diz o relatório Stern que foi o relatório que fez a avaliação económica de
quanto é que custa reduzir as emissões (a mitigação) e quanto é que custa não
fazermos nada? Diz o seguinte: se quisermos mudar de vida para atingir o tal
objectivo de 2 graus centígrados, reduzir as emissões, isso vai-nos custar 1%
do PIB (estou a falar à escala global) até ao final do século. Se não fizermos
nada, as consequências da mudança climática para a nossa vida, para os
ecossistemas, para a alimentação, para a Saúde, é de, na melhor das hipóteses,
5% o custo, ou 20% do PIB nos cenários mais catastrofistas.
Bom, vamos pensar no cenário de 5%
do PIB. Ainda assim estamos a falar de um custo 5 vezes superior ao custo da
redução das emissões. Por isso é que eu disse que só por irresponsabilidade, a
nossa geração, a vossa geração, não fará parte de um processo de liderança na
área das alterações climáticas. Seja porque isso é obrigatório, atendendo às
consequências e dados científicos que nós temos, mas também do ponto de vista
económico: hoje sabe-se que não fazer nada custa 5 vezes mais, sendo que, mudar
de vida, ainda por cima gera benefícios económicos, novas empresas, novos
empregos, novas áreas de inovação tecnológica que ultrapassam largamente os
custos da redução das emissões. Nós temos todos os dados económicos do nosso
lado se pensarmos numa escala temporal que ultrapasse os 2 ou 3 anos. Não é
possível olhar para as alterações climáticas com os olhos de uma legislatura,
nem em Portugal nem em nenhuma parte do Mundo. Se quisermos assumir um papel
responsável nesta área temos de fazer as contas e uma avaliação de impacto, da
mitigação, da inacção e dos benefícios económicos que ultrapassem uma pequena
escala. Depois, é preciso tomar decisões. Aqueles que dizem "ah, solução para
as alterações climáticas é ir já para os carros eléctricos”, ou "a solução para
as alterações climáticas é pegar nas centrais a carvão e injectá-los em poços
de petróleo que já não estão a produzir ou em estruturas geológicas, ou no fundo
oceânico. Bom, é uma questão de fazer contas. Até podemos chegar lá um dia, mas
é como tomar uma decisão para hoje que só é necessário ser tomada daqui a vinte
ou trinta anos. Porquê? Olhem para esta curva que a McKinsey fez (passo a
publicidade) de o custo marginal de abate de carbono. Neste primeiro segmento:
redução de emissões de até 10 giga toneladas não custa nada, é só benefício,
eficiência energética, mudar de vida não custa nada, portanto, é por aí que se
tem de começar. As primeiras reduções podem e devem ser feitas nas áreas onde o
custo é negativo: gera benefícios económicos porque se trata de alterações de
comportamento. A seguir temos, nas reduções seguintes, medidas mais caras e só
no final, reparem, só no final é que temos com custo de 30 euros a tonelada de
CO2, para as últimas reduções lá para 2050 precisamos das
tecnologias que estão hoje ainda a ser investigadas e que estão hoje ainda
pouco desenvolvidas.
Este é o critério das políticas públicas,
por isso fui sempre tão crítico daqueles que confundem política energética com
uma certa gadgetização da energia,
que é a única medida importante que muitos tentaram vender para reduzirmos as
emissões é produzirmos electricidade em casa, ou apostarmos apenas nas
renováveis. Ora, tão ou mais importante que isso é mudarmos de vida no consumo
de energia, na mobilidade, porque isso tem benefícios económicos mais
imediatos.
Este é o meu penúltimo slide, que
é o tal slide da factura que nós temos pela frente, feitas as contas,
custos/benefícios, chega-se à conclusão que o combate às alterações climáticas
é, não apenas urgente, mas está no nosso alcance, não é um objectivo
inalcançável. Temos as tecnologias, a informação científica e os mecanismos
regulamentares à escala global e europeia para chegar a esse objectivo e ainda
por cima compensa!
É por isso que este slide, o
último, é mesmo provocador. Se alguém vos disser que agora há coisas mais
importante na Europa, ou até em Portugal, e por haver essas coisas tão
importantes como resgatar o Euro, salvar a Economia europeia, salvar as
finanças públicas europeias e portuguesas, e se vos disserem que para fazer
isso o combate às alterações climáticas vai ficar para trás, se vos disserem
isso, estão a mentir. Primeiro, porque nós não temos o direito de escolher
neste momento. O combate às alterações climáticas não é uma questão de escolha,
é uma obrigação que impende a esta geração sob pena de não estar à altura da
sua responsabilidade quando estiver a ser avaliada pelas próximas gerações. Em
segundo lugar, porque o combate às alterações climáticas compensa; não tem
custos; tem custos que são largamente compensados pelos benefícios económicos.
Por isso, temos de fazer tudo ao mesmo tempo: salvar o Euro, resgatar a
Economia nacional e europeia, mas resgatar também o equilíbrio do Planeta.
Muito obrigado.
[APLAUSOS]
Nuno Matias
Muito obrigado ao nosso
Vice-Presidente pela brilhante exposição.
O primeiro Grupo a fazer uma
questão é o Amarelo, pelo José Pato.
José Pato
Bom dia. A pergunta que eu faço ao
senhor eng. Moreira da Silva é no plano local. Com o surgimento destas
tecnologias novas, dos telhados verdes e das fachadas fotovoltaicas, não se
deveria introduzir uma política local de redução dos níveis de carbono e de
eficiência energética nas próprias cidades?
Jorge Moreira da Silva
Muito obrigado. Essa é a área mais
importante, desde que não se confunda isso com a tal gadgetização da política energética. Eu vou chegar à sua resposta,
mas deixe-me fazer um statementinicial.
O anterior governo confundiu
Energia com Electricidade. Ora, a electricidade representa apenas 20% do
consumo de energia. O que aconteceu durante os últimos 6 anos é de que a
política energética foi apenas uma continuidade da aposta nas renováveis na
electricidade e não se fez absolutamente nada para a eficiência energética do
lado consumo e no sector energético que não é electricidade.
Fazendo uma conta rápida: imagine
que nós temos uma meta, a tal de 31% para 2020 em Portugal e isso é energia
globalmente e electricidade. Isso representa 60% de renováveis até 2020. Se
está a fazer 60% de 20%. Está, no fundo, a tratar de 12% da energia em
Portugal. Tudo o que seja limitar a política energética a uma política nas
renováveis é na melhor das hipóteses, limitar a política energética a 12% de
Energia. Nós temos de olhar para aquilo que não é electricidade, para os usos
que não são electricidade, nomeadamente os transportes, na indústria onde ainda
se consome produtos petrolíferos para combustão, na utilização do gás, tudo o
que são utilizações de combustão, utilizações térmicas que não são
electricidade, bom, isso representa 80% do consumo de Energia em Portugal. Isso
tem sido totalmente esquecido nos últimos anos. Portanto, não é possível deixar
de olhar para isso. O mesmo – e era aí que eu queria chegar, à sua pergunta –
sob a eficiência energética. Se olharmos para a eficiência energética numa
cidade, dizemos: "bom, eu vou nesta cidade instalar painéis fotovoltaicos para
produzir electricidade nas casas, em milhares de casas e isso é a minha
política para eficiência energética”. Isso não é nada para política energética,
isso é mais uma vez política de produção de electricidade renovável, mas à escala
local descentralizada – eu não sou contra, pelo contrário, acho que a tendência
vai ser muito essa: vamos ter uma internet de energia, cada vez mais vamos ter
uma produção de energia descentralizada e nós vamos começar a consumir mais em
casa a própria energia que vamos produzir.
Mas nós não podemos massificar um
programa que não está ainda, do ponto de vista tecnológico, suficientemente
amadurecido para ser massificado. O problema aqui é uma questão de escala. Em
Portugal, muitas vezes esquecemos que há uma fase de investigação, de
demonstração, há uma fase de decisão e há uma fase de massificação. A
tecnologia é isso que acontece: investigação, demonstração e massificação. Em
algumas áreas da investigação, que é a área da eficiência energética, da micro-produção,
da produção de electricidade em casa e que nós recebemos 300 euros por
megaWatt/hora e depois compramos mais barata a electricidade que nós próprios
consumimos, isso está bem à escala de demonstração, mas não à escala de
massificação e o segundo erro é confundir isso com eficiência energética.
Porque isso não reduz o consumo. A eficiência energética é a redução do consumo
de energia. Não é uma nova forma de produção de energia. O que nos foi vendida,
nos últimos 6 anos, foi a ilusão de que eficiência energética passava pela
produção de energia na nossa casa. Desculpem, é mais eficiente massificar
painéis solares térmicos para aquecimento da água, porque isso sim reduz o
consumo de gás natural ou de electricidade do que massificar a produção de
electricidade.
Portanto a sua questão, estou
completamente de acordo. Soluções de construção de arquitectura bioclimática,
de melhor comportamento dos edifícios, soluções que permitam uma redução do
consumo de energia são uma prioridade.
Ao longo do tempo podemos ir
fazendo, avançando com políticas de produção descentralizada. Eu não defendo
que se pare com o programa, mas acho é que não se deve sacralizar algo que
representa apenas uma pequena parte daquilo que deve ser a prioridade que é a
redução do consumo.
Alguma pergunta me permitirá a
seguir falar de transportes? Porque eu gostaria de ligar a questão dos
transportes na cidade também à sua pergunta, mas já tenho aqui um ok a dizer que o tempo terminou,
portanto eu depois vou utilizar parte da sua pergunta para responder no tempo
de outro colega.
Nuno Matias
Muito obrigado. O Grupo Bege,
Tiago Cunha.
Tiago Cunha
Antes de mais, bom dia. Na sua
opinião, o é que o Governo português no espaço de uma legislatura ou no futuro
a médio prazo, poderá fazer para equilibrar novamente o mix energético português?
Jorge Moreira da Silva
Bom, a primeira questão tem a ver
com a arquitectura. Eu como disse há pouco, não se pode confundir energia com
electricidade e é preciso pensar energia globalmente.
Segundo, é preciso integrar clima
e energia. Por isso, fui sempre defensor, como sabem, que houvesse um
Ministério de Ambiente, Energia e
Transportes ou de Clima, Energia e
Transportes. Não é condição necessária suficiente, mas podia ajudar.
Significa isto, que não havendo um Ministério de Clima, Energia e Transportes
podem ser encontradas soluções, de qualquer forma, para que a políticas de
Energia e de alterações climáticas possa ser integrada, porque hoje temos várias
caixinhas. Se alguém conseguir identificar metade dos planos que existem em
Portugal para alterações climáticas e energia nesta sala é um especialista.
Porque nós temos o Plano Nacional para Alterações Climáticas, depois temos o
Plano Nacional de Alocação de Licenças de Emissão, depois temos o Plano para as
Energias Renováveis, depois temos o Plano para a Eficiência Energética, depois
temos os Planos Rodoviários, depois temos os Planos sectoriais de
desenvolvimento de baixo carbono.
Portanto há uma miríade de Planos
para a área da Energia e o que me parece que seria importante (para dar a
primeira parte da resposta à sua pergunta) é: nós precisamos de um plano
integrado de Clima e Energia que receba indicadores – aquilo que não se faz em
Portugal que é Planeamento Energético, isto é, qual é que vai ser o plano
energético para 2020, para 2050, para 2100; quais são as curvas para
desenvolvimento tecnológico nessas áreas; quais são as curvas macroeconómicas
de crescimento e da Economia; quais são os índices demográficos - e a partir
desses indicadores, melhor, a partir dessa matriz de planeamento, isto cospe
indicadores e (passo a expressão), cospe metas.
Essas metas depois, de Energia e
de Clima, são concretizadas através daquilo que eu gosto de chamar de "Orçamento
de Carbono”, que é: há uma meta global para renováveis, para redução
energética, redução de consumo e para redução de emissões e, depois, há um
"Orçamento de Carbono” que é dizer ao senhor Ministro: "O senhor tem a seu
cargo "x” toneladas de redução de emissões”; ao Ministro da Agricultura: "Olhe,
o senhor tem "y”; ao de Educação: "Você tem "z”. Há uma alocação de
responsabilidades em termos de emissões não apenas aos agentes económicos, mas
também àqueles que são responsáveis, do ponto de vista sectorial, pelas várias
políticas.
Finalmente: é necessário um
sistema que permita envolver os cidadãos nesta política porque eu também não
concordo com uma política energética paternalista que quase que dispensa a tal
mudança de comportamentos. E para isso não há nada melhor que fixar metas per capita. É óbvio que elas são em
média, mas permite que os cidadãos percebam que fazem parte dessa mudança. Por
isso o trabalho que fui fazendo com o Gabinete de Estudos no último ano e meia
(para responder à sua questão), para além desta nova arquitectura
institucional, propúnhamos três coisas: primeiro, que a meta das renováveis
fosse mantida, mas que fossem alterados os pesos das diferentes fileiras;
provavelmente baixar a meta das renováveis na electricidade, mas aumentar muito
a meta na produção de calor, portanto, alterar a meta mas manter o mix. Porquê? Porque Energia não é Electricidade.
Segundo: alterar a meta da
eficiência energética. Um país que é o país mais depende energeticamente do
exterior (na Europa apenas a seguir ao Luxemburgo); um país que tem uma das
altas intensidades energéticas no PIB e uma das mais altas intensidades nos
Transportes, é um país que não se pode dar ao luxo de ficar na média da
eficiência energética. Portanto, aquela meta europeia dos 20% das emissões não
é adequada a nós, é adequada àqueles que já têm uma eficiência energia
razoável, uma intensidade nos Transportes, uma intensidade da energia no PIB,
razoável. Para aqueles que são perdulários na área da energia; que atiram pela
janela fora a aposta que fazem nas renováveis – nós somos aqueles que apostamos
nas renováveis, mas depois desbaratamos pela janela porque estamos a crescer
exponencialmente no nosso consumo de energia, seja nas nossas casas, seja nas
indústrias, ou nos transportes.
Portanto, neste contexto, o que
propusemos é que a meta portuguesa de eficiência energética passasse a ser de
25% até 2020 (em vez dos 20%) e que o Estado desse o exemplo com uma meta de
35%, porque nestas coisas o Estado tem de dar o exemplo: nas suas frotas, nos
seus edifícios, nas suas políticas de mobilidade do trabalho, o Estado tem de
dar o exemplo e hoje não dá o exemplo. O Estado tem edifícios que consomem mais
energia do que os edifícios das nossas casas que já consomem demasiada energia,
o Estado tem uma frota automóvel que emite mais CO2 que a frota
média e o Estado tem uma política de mobilidade que não é a mais adequada.
Finalmente era o terceiro pilar em termos de metas: uma meta per capita para 2020 e para 2050.
As metas hoje, em Portugal, a
nossa meta para Quioto é de 66 toneladas até 2012, o que dá 7,6 toneladas por
cidadão. Nós sabemos que cada um de nós tem direito a emitir 7,6 toneladas até
2012. Ser quisermos estar em linha com os tais objectivos que falei há pouco
para 2020 e 2050, o que venho defendendo é que a nossa meta seja de 6,5
toneladas por habitante em 2020 e de 2 toneladas por habitante em 2050. Qual é
a vantagem de a gente poder avançar estas metas per capita? É que permite dizer às pessoas, que não é o país que
vai ter de reduzir as suas emissões 25%, 40%, 50%, é cada um de nós que, por
políticas nacionais, mas com o envolvimento da mudança de comportamentos de
cada um de nós, que vai emitir 2 toneladas por habitante em 2050 e 6,5
toneladas em 2020. Portanto, eu acho que estas políticas permitiriam uma
alteração do nosso mix energético,
mas a alteração do mix energético começa pelo consumo de energia.
Nuno Matias
Muito obrigado. Terá agora a
palavra o Grupo Roxo através do Paulo Alexandre Santos.
Paulo Alexandre Santos
Antes de mais, muito bom dia. A
minha questão é sucinta: gostava de saber qual deve ser o posicionamento da UE
no que respeita a este binómio Energia/Ambiente, de modo a ajudar a nossa
competitividade relativamente às novas potências? Obrigado.
Jorge Moreira da Silva
Bom, a Europa tem de basicamente
não perder a vantagem de pioneiro. A Europa, que foi literalmente quem resgatou
o Protocolo de Quioto, numa altura em que a Austrália decidiu não ratificar e
que os Estados Unidos decidiram não ratificar, como o Protocolo precisava de
55% das emissões para poder entrar em vigor, foi necessário que a Europa
andasse literalmente a bater à porta dos outros países para que o Protocolo de
Quioto entrasse em vigor.
A Europa fez isso assumindo um
ónus, que foi o de poder eventualmente perder competitividade. Eu estava no
Parlamento Europeu nessa altura e esse era o grande debate que se fazia na
altura. Porque é que a Europa havia de querer entrar no Protocolo de Quioto,
resgatar o Protocolo de Quioto; reduzir as suas emissões em 8% até 2012 quando
os Estados Unidos e a Austrália ficaram de fora e quando alguns países em vias
de desenvolvimento, como é o caso da Índia e da China, não tinham metas
vinculativas? A avaliação foi política, num quadro de responsabilidade, que é:
a Europa faz isto porque deve fazer isto. É por isto que eu sou tão Europeísta,
porque a Europa foi conseguindo, por razões que não eram mero interesse próprio
mas por razões de bem comum, tomar as decisões que devia de tomar na altura em
que as devia de tomar. Esse foi o caso do Protocolo de Quioto, os deputados
assumiram, a Europa assumiu, que nós não podemos fazer o mesmo que os Estados
Unidos! Temos a obrigação de estar em Quioto e de envolver outros países em
Quioto.
Mas houve também uma segunda
avaliação que foi importante para convencer os empresários e as empresas
europeias. Muitos, de facto, pressionaram os governos, a Comissão Europeia, o
Parlamento Europeu, para que a Europa não estivesse em Quioto e fizesse o mesmo
que os Estados Unidos; dizendo que enquanto os Estados Unidos não viessem para
o Protocolo de Quioto, nós também não devemos estar. E a resposta que foi dada
na altura e que felizmente foi bem entendida, foi uma resposta assente na
avaliação económica que é: aqueles que assumirem mais cedo objectivos
ambientais mais ambiciosos têm no curto prazo um ónus, mas têm no médio e longo
prazo uma vantagem comparativa que é a vantagem do pioneiro.
Eu recordo-me bem – a vantagem do
pioneiro é em termos de novas tecnologias, inovação – de uma delegação que
chefiei, de uma das cimeiras quando estávamos a negociar o Protocolo de Quioto,
uma delegação do Parlamento Europeu que se encontrou com uma delegação de
Congressistas americanos (eu conto esta histórias muitas vezes). Nessa altura
os Estados Unidos já tinham decidido não entrar no Protocolo de Quioto e os
americanos (congressistas e alguns senadores) perguntavam: "mas porque é que
vocês na Europa querem estar nessa coisa do Protocolo de Quioto quando isso vos
vai fazer perder dinheiro e eventualmente até eleições? Portanto, estavam muito
condicionados, ou muito perplexos com isso e quando depois numa cimeira
seguinte voltámos a ter uma reunião quando o comércio de carbono já estava
desenhado, a pergunta já não era essa, era: "Que benefícios económicos espera a
Europa ter da participação no Protocolo de Quioto através do sistema europeu de
comércio de emissões, quantos posto de trabalho estão à espera de serem gerados
nos sectores da Energia, dos Transportes, por aí adiante?”. Por esta altura na
narrativa dos acontecimentos, do lado de lá do Atlântico começou a
percepcionar-se, primeiro na área económica e só depois na área política, que a
não-participação no Protocolo de Quioto tinha uma vantagem muito limitada no
curto prazo, mas grandes desvantagens para os Estados Unidos no médio e no
longo prazo.
É por isso que a alteração se foi
fazendo. Eu recordo-vos que na última campanha norte-americana, não foi apenas
o Presidente Obama que defendeu uma política para alterações climáticas, mas o
senador McCain também a defendia. Mas na eleição anterior, ou melhor, quando o
Bill Clinton decidiu não colocar o Protocolo de Quioto para votação no Senado
em 98, ele não o fez por ser contra o Protocolo – ele sempre foi a favor de
Quioto, tal como o Al Gore -, o problema é que a esmagadora maioria dos
senadores democratas e republicanos era contra.
Portanto, enquanto em 98 havia um
larguíssimo consenso contra o Protocolo de Quioto, dez anos depois passou a
haver um larguíssimo consenso a favor do Protocolo de Quioto. Porquê? Eu não
quero entrar nas razões que tem a ver com a ética, com aquilo que considero que
é obrigação dos líderes e dos políticos que é fazerem aquilo que devem fazer
independentemente de vantagens próprias no curto prazo, mas houve aqui
claramente uma avaliação económica que as próprias empresas americanas
começaram a fazer sentir aos seus líderes.
Logo, a Europa que já passou
tanto, o que custou ficar sozinha durante dez anos neste processo, não pode
agora atirar pela janela essa vantagem de pioneiro, porque se o fizer vai
entregar a outros, numa altura em que estamos todos a competir por Emprego, por
Talento e Investimento, vai entregar aquela que foi uma das vantagens há dez
anos atrás.
Nuno Matias
Muito obrigado. Tem a palavra o
Grupo Encarnado, Cristina Faria.
Cristina Faria
Estamos num mundo global e de tão
global que é, ele está propenso às mais diversas fatalidades ambientais.
Após séculos de poluição
intensiva, sem limites, ou sem os respeitar, como é que podemos pedir aos
países em desenvolvimento o respeito pelas quotas apertadas dos níveis de
poluição quando a forma de desenvolver um país passa pelo consumo de energia
"suja”. Faz sentido também aplicar o sistema de poluidor/pagador a esses
países? Ou seja, nesta situação estamos numa actualização entre aquilo que é qualidade
de vida e aquilo que é o desenvolvimento. Portanto, acabamos nós, os países
ocidentais, por ser os absorventes da economia dos produtos mais baratos, mas
também são os mais poluentes e acabamos por não ter qualquer perspectiva de um
desenvolvimento sustentado a médio e a longo prazo.
Jorge Moreira da Silva
Essa questão está muito
relacionada com a anterior que tem a ver com as vantagens da Europa e de países
industrializados em seguir um determinado padrão que possa ser visto como
desvantajoso do ponto de vista económico se comparado com os países em vias de
desenvolvimento. Eu, como disse, continuaria a defender isso, mesmo que
existissem desvantagens económicas, porque acho que a liderança tem sempre um
sentido ético. Mas neste caso o jogo mudou. A produção deste copo – o Carlos já
me viu fazer isto várias vezes, mas apesar de tudo acho que é um exemplo que
funciona sempre – antes da Economia do Carbono (eu vou depois chegar aos países
em desenvolvimento), dois empresários produzem dois copos antes do sistema
europeu do comércio de emissões, antes de existirem metas de redução para as
empresas, e não havia nenhum incentivo para que eu (empresário) passasse a usar
tecnologias "mais limpas”, muito pelo contrário, para que é que eu havia de
estar a gastar dinheiro em novos fornos, em novos modos de produção se isso não
era, primeiro, obrigatório, segundo, reconhecido pelo público, terceiro,
arriscava-me a perder a produtividade que me faria sair do mercado. Ora, hoje é
o contrário, dois copos, dois produtores de vidro na Europa ou Portugal. No
preço final, para além do custo da matéria-prima, da mão-de-obra, de marketing
e transporte, há um custo que está incorporado que é o custo do CO2. Porque
como essa empresa está no sistema de comércio de emissões, ou tem uma meta de
política nacional que a obriga a reduzir as emissões, ele começa a passar o
custo que tem com o CO2 para o consumidor (é assim que funciona na
Economia), logo, o empresário que produz o mesmo copo de uma forma "mais
limpa”, hoje vence e não perde.
Dirão ”mas isso é só na Europa,
como é que nos países em vias de desenvolvimento eles podem exportar para cá
produtos que não têm essa componente?”. Nós estamos numa alteração de paradigma
que está a envolver também esses países, porquê? Porque esses países começaram
por estar no Protocolo de Quioto sem nenhuma meta vinculativa, tinham apenas um
incentivo que é: bom, se a sua fábrica de vidro em Angola mudar o forno para em
de fuelóleo passar a usar gás natural, isso vai-lhe baixar as emissões, logo,
vende os créditos de emissão para a Europa, teve aí uma vantagem económica.
Isso hoje já existe, mas é muito induzido pela liderança, por uma acção
voluntária, mas isso vai mudar, porque os países em vias de desenvolvimento já
assumiram em Copenhaga e, agora, em Cancun uma meta de desvio de tendência,
todos os países assumiram que unilateralmente vão colocar em cima da mesa uma
meta de redução ou de contenção de crescimento das suas emissões. E isso não é
válido apenas para os países industrializados, também os países em vias de
desenvolvimento, por primeira vez, a seguir a 2012 vão ter objectivos
quantificados de desvio de tendência. Por exemplo, o Brasil tem, assumiu já,
uma meta muito ambiciosa de redução das emissões ou contenção das emissões, a
Índia também, a China também já assumiu, portanto há uma tendência. Se olharmos
para a regra do jogo, já não é a longo ou médio prazo, no curto prazo esses
países em vias de desenvolvimento vão ter também de descarbonizar os seus
modelos de desenvolvimento, logo, a Europa vai deixar de estar tão sozinha
neste debate sobre a descarbonização e os produtos europeus não serão
penalizados por isso.
É por isso que eu hoje discordo
daquilo que defendia há dez anos atrás. O deputado Carlos Coelho lembra-se. Eu
defendia, no momento em que os Estados Unidos abandonaram o Protocolo de
Quioto, a introdução de uma taxa que é considerada uma Border Tax Adjustement e é produtos americanos exportados para a
Europa com elevado conteúdo de CO2 deviam ser taxados, porquê?
Porque considerava que um país tinha legitimidade para não estar no Protocolo
de Quioto, mas não tinha legitimidade para tirar vantagem competitivas
ilegítimas pelo não-cumprimento dessa obrigação ética. Hoje já não concordo com
isso, porque já não vale a pena. Porque se isso há dez anos era útil para
forçar os Estados Unidos a juntarem-se ao Protocolo de Quioto, hoje isso mudou,
porque já ninguém põe em causa a ideia que temos de descarbonizar o nosso
modelo de desenvolvimento e os próprios países em vias de desenvolvimento já
estão no processo de descarbonização desse modo de produção.
Dou um exemplo prático. Peço
desculpa, preciso de 30 segundos. Estive em Angola há um mês como Director das
Nações Unidas, estive lá e vi projectos – voltando um pouco atrás: Angola não
tem nenhum projecto CDM; aliás, nenhum PALOP que tenha mecanismos de
desenvolvimento limpo, registados os tais projectos que dão créditos; portanto,
África não tirou partido da Economia do Carbono, quem tirou partido foi a
América Latina e o Sudoeste Asiático – e eu tive a oportunidade, agora que em
Angola há uma lista longa de projectos que se preparam para se registar como
crédito de carbono, de dar um exemplo prático.
Eu fui a uma Central no Soyo que
transforma aqueles gases que são gerados na prospecção de petróleo. Sabem
quando há prospecção de petróleo, são libertados gases que não têm outro
destino senão serem queimados. A queima desses gases tem por isso um prejuízo
ambiental que as Nações Unidos, o tal mecanismo de desenvolvimento "limpo”,
procura evitar. Ora, neste momento Angola tem um projecto que se chama LNG, que
junta oito petrolíferas no Soyo, que decidiram que em vez de queimar esse gás à
saída da chaminé nos poços de petróleo, construíram uma central que vai
aproveitar esse gás, sob alta pressão colocá-lo no estado líquido, exportá-lo
por via marítima para os Estados Unidos, ou transportar esse gás por um
gasoduto ou oleoduto para produção de gás em Luanda. Sabem o que é que isto
representa? Representa uma redução das emissões, por ano, de 12 milhões de
toneladas de CO2. Quantos créditos é que vão ser gerados? Vão ser
gerados por ano 150 milhões de euros de créditos de carbono que Angola vai
poder beneficiar pela simples circunstância de um projecto, que em qualquer
caso tinha de ser feito, ser elegível.
Logo, hoje existem muitos
incentivos do ponto de vista da Economia do Carbono para que esses países em
vias de desenvolvimento possam descarbonizar os seus modelos de
desenvolvimento. Portanto, não vale a pena voltar ao debate das vantagens
Norte/Sul das comparativas e do dumpingambiental. Isso é conversa do passado, hoje temos de tirar partido desta
competição global em que todos competem pela produção "mais limpa”.
Nuno Matias
Tem agora a palavra o Grupo Verde
através do José Miguel Vitorino.
José Miguel Vitorino
Bom dia a todos. Bom dia senhor
eng. e obrigado por estar aqui na Universidade de Verão. A questão do Grupo
Verde não foi abordada aqui mas ainda assim gostaríamos de a ver esclarecida.
Numa perspectiva futura, com o aumento do consumo de energia, há quem seja a
favor da instalação de uma central nuclear em Portugal, mesmo sabendo que pode
não ser o mais correcto e tendo noção dos riscos que isso acarreta. Por que não
tirar partido da Central de Almaraz, fazendo uma parceria ou protocolo se
também nós somos os principais afectados em caso de acidente? Obrigado.
Jorge Moreira da Silva
Ou porque não convencer o governo
espanhol a desmantelar a central de Almaraz e pôr em causa o seu programa
nuclear e sermos cada vez mais exigentes numa relação transfronteiriça com os
nossos vizinhos, fazendo perguntas e querendo ter cada vez mais respostas sobre
os níveis de segurança que nos afectam? Isto é, eu prefiro colocar a questão ao
contrário.
Eu, anteontem, num daqueles
programas que a Sic Notícias passa, agora mais tarde, vi o debate do nuclear
entre um adepto do nuclear e uma pessoa contrária ao nuclear. O Pedro Sampaio
Nunes a favor e o nosso amigo Carlos Pimenta contra.
Qual foi o azar? É que esse
programa tinha sido gravado há oito meses e eu ouvi o defensor da energia
nuclear dizer que a energia nuclear era a energia mais segura, mais limpa e
mais competitiva. O problema é que isso foi dito antes do acidente de Fukushima.
O Japão é um dos países mais avançados tecnologicamente; um dos que tem
mecanismos de administração pública e monitorização exigentes e um dos que tem
uma cultura de responsabilidade mais elevada. Logo, se Fukushima foi possível
no Japão, pode ser possível em qualquer parte do Mundo.
Portanto, eu não estou de qualquer
maneira convencido, como já perceberam sou contra a energia nuclear em geral,
não apenas em Portugal, sobre Portugal a questão é mais fácil, mas em geral sou
contra porque há custos ambientais que não aparecem no KW/hora. Enquanto o
carvão, se o meu caro amigo tem uma central a carvão, é obrigado no KW/hora
final a internalizar o preço do CO2, tem de pôr lá porque está no
comércio de emissões, portanto tem uma obrigação da redução das emissões, tem
de pôr lá no seu preço final a externalidade ambiental; se tiver uma central
ambiental ninguém o obriga a internalizar o custo do acidente ou tratamento de
resíduos porque isso é uma questão do Estado ou é algo que as seguradoras
preferem não assumir completamente em termos de volume de risco. Portanto, há
uma parte de dado ambiental que é o risco de acidente, o tratamento de resíduos
que não está internalizado no preço final.
O que eu defendo é que todos os
custos devem estar internalizados no custo final, todos. As alterações
climáticas, eu acho que são o tema mais importante, como perceberam, na área do
Ambiente, mas há outros problemas ambientais, logo, as centrais nucleares que
de facto não têm tantas emissões de CO2 têm outros problemas ambientais,
mas têm conseguido porque regra geral as centrais nucleares são matéria de
capitalismo de Estado. São centrais, como sabem em Espanha há a Areva – a
empresa pública – são empresas que têm vantagens comparativas em relação a
outras porque beneficiam do acionista ser o Estado, portanto está ali um preço
final de KW/hora que está "martelado” (passo a expressão) e que não considera
todos os custos.
Àqueles países que já têm energia
nuclear, o que eu peço é que cumpram padrões de segurança elevados, que
disponibilizem informação e que internalizem no preço final do KW/hora. É óbvio
que a Índia e a China estão a construir uma central nuclear ao ritmo de uma ou
duas por semana em média, não pode travar o seu projecto nuclear de um dia para
o outro, substituindo por renováveis, é impossível. Mas para países que estão
nessa aposta, o que devemos ser é exigentes em relação ao padrão de segurança e
à racionalidade económica; para países que não estão no nuclear, que é o caso
de Portugal, devemos perguntar é porque é que haveremos de entrar no nuclear.
Porque é que um país tamanho S terá de escolher uma opção XL, que é o que eu
costumo dizer sempre.
Uma central nuclear não se faz por
menos de 1800 megawatts. Portanto, se nós fizermos uma central em Portugal, o
contrário do que muita gente diz, não é para reduzir a dependência energética
do exterior. A central nuclear abastece automóveis hoje? A nossa dependência
energética do exterior é petróleo, Transportes, se uma
central nuclear for construída vai afastar as renováveis e a co-geração. Nós
temos de assumir que quem defende a energia nuclear em Portugal defende que
deve haver uma redução nas renováveis, mas é uma limitação drástica, porque
1800 megawatts na melhor das hipóteses é muito mais do que hoje já temos
construído. E ninguém pode ter só uma central nuclear, porque é como centrar
todo um sistema numa central, há um risco de se houver uma paragem se tiver
todo o seu sistema electroprodutor que não precisa de uma central nuclear,
porque hoje já tem co-geração, já tem renováveis, mas se ainda assim decidir
"vou parar com tudo, vou pôr uma nuclear”, muito bem, onde está a segunda?
Porque as centrais nucleares também param e o risco, o sistema não pode
colapsar; uma das regras básicas da política energética é a segurança de
abastecimento, tem de haver vários sistemas de redundância para que quando
falha um sistema entra outro, é por isso que nós temos mais capacidade
instalada em Megawatts do que a energia que precisamos. Porquê? Porque se
houver um sistema que falha, nós temos a obrigação legal, está isso no contexto
europeu, cada país tem que assegurar a segurança de abastecimento, porquê?
Porque senão é toda a rede europeia que entra em colapso. Porque se não
tivermos a tal central nuclear ou a tal central de co-geração, a seguir vamos
ter que "isto falha” e vamos ter a França ou Espanha e há uma falha em cascata.
Eu não defendo a energia nuclear
em Portugal desde logo, antes das razões ambientais, por razões de política
energética. Segundo: por razões ambientais, como perceberam – risco de acidente
– porque é que havemos de ficar com esse ónus se existem alternativas? Em
terceiro lugar, porque é entrar tarde demais.
Eu nunca defenderia a energia
nuclear em qualquer circunstância, mas entrar nesta fase quando estamos na
ponta final de uma determinada tecnologia. Eu percebo os países que entraram na
fase inicial de uma determinada tecnologia, que foi amadurecendo, que se foi
desenvolvendo. Agora, nós sabemos que esta tecnologia está a entrar em declínio
e que a seu tempo entrará uma mais avançada, mais segura, etc.
Não faz nenhum sentido, em termos
de política de inovação um país entrar na parte final de um ciclo de uma
tecnologia que está a entrar em declínio.
Finalmente, meu caro amigo, como é
que estão as contas públicas? É que não há tecnologia de mais capital intensivo
que o nuclear, em que enquanto numas barragens há alguma incorporação de valor
nacional, nas eólicas há incorporação de valor nacional: mão-de-obra,
tecnologia e por aí adiante; bom, o nuclear é chave-na-mão: venha o reactor
francês, ou da Areva, ou escocês, ou inglês, ou vem da Coreia do Sul. Portanto,
é capital intensivo, para a nossa Economia nesta fase é impossível; segundo
lugar: incorporação de valor nacional, zero; terceiro lugar: desvantagem em
termos de política de segurança de abastecimento; quarto lugar: desvantagens
ambientais. Portanto, eu não defendo o nuclear como já se percebeu e acho
sinceramente que o nuclear é um assunto arrumado; de vez em quando aparece
porque há sempre gente que tem interesse em falar nestas coisas mas basta fazer
as contas e nós hoje não precisamos do nuclear e a entrada no nuclear obrigava
a desmantelar todos os projectos que já estão feitos. Portanto, nuclear, que
barragens vamos fechar, que co-geração vamos fechar, que eólicas vamos fechar,
que solar fotovoltaico vamos fechar, caso contrário o nuclear é supérfluo.
Nuno Matias
Tem
agora a palavra o Grupo Cinzento através do João Pires Ribeiro.
João Pires Ribeiro
Bom dia e obrigada pelo tempo que
partilhou connosco.
Nós vamos partir de uma citação
sua do ano 2000, em que disse na altura que eram oito anos depois do Rio e três
depois de Quioto, que se viveria, na sua opinião, o momento mais crítico, o
momento da verdade. Entretanto já passaram mais dez anos e parece que nem todos
os países continuam com essa preocupação ambiental e lá está ter demorado três
anos a ser ratificado Quioto.
Tendo o senhor engenheiro
participado em processos internacionais, acredita que os países têm uma
verdadeira preocupação ambiental ou se se tornou meramente económica através do
sistema de mercado e da venda de créditos? Acabando com a sua citação, fazendo
novamente a mesma pergunta: acredita que ainda estamos no momento da verdade em
relação às alterações climáticas? Obrigado.
Jorge Moreira da Silva
Infelizmente as coisas demoraram
mais tempo do que seriaexpectável,
porque todas as informações, todos os dados que tínhamos ao nosso dispor em
2000, na área da Ciência são praticamente os mesmo que temos agora. Portanto, a
comunidade internacional, a política, os políticos, têm sido lentos em assumir
a responsabilidade que há muito tempo tinham a obrigação de assumir. Porque
desde o início da década 90, existe uma relação causa/efeito entre emissão de
gases de estufa e alterações climáticas.
Diria hoje que estamos perante um
segundo momento da verdade: porque se em 2000 o que precisávamos era de
resgatar o Protocolo de Quioto e apesar de tudo ainda tínhamos – para o período
de vigência do Protocolo de Quioto, que era a janela temporal eu era 2008-2012
– algum tempo, ainda assim eu considero que se perdeu muito tempo (de 92 até
2005) para que ele entrasse em vigor, ainda assim havia alguma margem para a
janela de redução das emissões de 2008-2012. Hoje é pior porque 2012 é amanhã e
nós não temos nenhum protocolo válido para depois de 2012. Reparem, a citação
paradoxal em que nos encontramos. Hoje temos mais informação económica que
demonstra que compensa agir, temos a mesma ou mais informação do ponto de vista
científico quanto à necessidade de agir e, ainda assim, estamos a um ano do
Protocolo de Quioto e não encontramos um sucessor. As várias rondas negociais
têm tido passos de bebé: Copenhaga, Cancun; ora, nós estamos numa fase em que é
necessário fechar um acordo global a tempo de encontrar um sucessor para o
Protocolo de Quioto. A minha opinião pessoal é que chegou a altura de acabar com
um certo cinismo na diplomacia na área das alterações climáticas e eu considero
que em Copenhaga se cometeu um erro grave quando se baixaram as expectativas a
duas semanas da Cimeira. A Cimeira de Copenhaga em 2010 estava marcada há dez
anos. Nós sabíamos que tínhamos de encontrar um sucessor do Protocolo de Quioto
até 2010 e essa data era conhecida há dez anos e durante dez anos em todos os textos
das embaixadas, todos os textos do Parlamento Europeu, do G8, do G20, das
Nações Unidas, dizia: a comunidade internacional assumia o objectivo de na
Cimeira em Copenhaga encontrar um regime climático pós-2012 com o objectivo de
travar o aumento da temperatura em 2 graus centígrados através de uma redução
em 50% até 2050. Têm esta frase em tudo o que é documento internacional
sufragado, assinado, pelos líderes internacionais e a duas semanas da Cimeira
de Copenhaga, quando estávamos, negociadores, ainda em Barcelona na pré-Cop, na
última ronda para tentar fechar um acordo e é um acordo difícil porque é mais
ambicioso, porque em vez de 5% estamos a falar para países industrializados de
reduzir 25% a 40% é duro, é um acordo difícil, estamos a falar da primeira vez
de contenção do crescimento das emissões em países em desenvolvimento (é a
primeira vez que isso acontece), é um acordo duro porque há realidades
económicas e sociais diferentes entre o Norte e Sul, mas nós já sabíamos disso
há muito tempo. Ainda assim, havia uma pressão política sobre os negociadores –
eu sou negociador e sei o que é pressão política – que é ter um texto do G8, do
G20 e a três ou duas semanas há uma declaração conjunta nalguns casos e
sucessiva noutros, em que os líderes dos Estados Unidos numa Cimeira do G20, em
que os mais importantes líderes globais, disseram que já não era possível encontrar
um acordo em Copenhaga e que se procuraria encontrar um entendimento político.
Sabem o que é que acontece quando se vai do plano A ao plano B, chega-se ao
plano F que é o plano de falhanço; que foi o que acontece. A malta sentiu
imediatamente: "como é que eu posso sair da minha zona de conforto; para que é
que eu hei-de sair da minha zona de conforto cedendo, se ainda por cima deixou
de haver essa pressão. Porque nas negociações, como sabem, a questão é muito
simples: se há obrigação de um acordo, eu cedo, tu cedes, se deixou de haver
uma obrigação de um acordo eu não cedo tanto, tu não cedes tanto e não há
acordo nenhum; foi isso que aconteceu.
Eu quando falava de cinismo nas
negociações queria dizer precisamente isto, que não é possível ter um discurso
a favor das alterações climáticas e, depois, não colocar a fasquia alta em
relação à necessidade de um acordo. E eu espero que a Europa – eu sou europeu e
orgulho-me nisso – não prescinda do seu papel de até Durban (temos a Cimeira de
Durban em Dezembro), como outras nações, resgatar a responsabilidade e a
liderança que está perdida há muito tempo nestas negociações. Até porque as
pessoas começaram a fartar-se das negociações; já começa a haver muito pouca
paciência para a conversa das negociações porque já sabemos que estamos
infelizmente a passar por um impasse nestas negociações, mas isso não pode
servir de desculpa para não agirmos.
Era esta a mensagem-chave, se
quiserem. Se eu tivesse de terminar a sessão terminava dizendo que nós temos de
trabalhar independentemente das negociações internacionais. Isso é uma
desculpa, dizermos que estamos à espera do sucessor do Protocolo de Quioto para
mudarmos de vida, é uma desculpa.
Nós hoje sabemos que temos de
mudar de vida, sabemos porquê, quanto custa, quanto ganhamos com isso, logo,
podemos no dia-a-dia, Empresas, Estado, Cidadãos, Europa, podemos agir mesmo
que não exista um acordo internacional, mas não devemos baixar a pressão sobre
os líderes para que eles encontrem esse acordo. Acho que, hoje, o que está a
faltar é pressão: não sinto, sinceramente, pressão na opinião pública, não
sinto pressão na comunidade internacional, não sinto pressão por parte de
alguns governos em relação a outros dizendo: "Meu caro amigo, nós já tínhamos
aceite que haveria um acordo para o pós-2012, chegou a altura de colocar as
acções e o dinheiro onde estava os pensamentos e a boca”.
Nuno Matias
Pelo
Grupo Castanho, o Pedro Roberto.
Pedro Roberto
Bom dia, senhor eng. Jorge Moreira
da Silva. A questão do Grupo Castanho vai muito ao encontro da explanação que
fez há pouco nomeadamente no que diz respeito aos objectivos climáticos da
União Europeia. Explanou-os a longo prazo, até 2020. Nós queríamos questioná-lo
sobre os objectivos climáticos da União Europeia, mas até 2050. Isto é, pela
pesquisa que fizemos, eles passam por reduzir entre 60% e 80% as emissões de
gases com efeitos de estufa, passam por aumentar em 30% a eficiência energética
e passam também por fazer progredir para 60% a percentagem de Energias
Renováveis face ao consumo energético total da União Europeia.
A pergunta que lhe faço é, então,
a seguinte: acredita que estes valores são viáveis tendo em conta sobretudo os
comportamentos ambientais com que nos deparamos hoje, ou nunca nos permitirão
atingir estas metas. Ou seja, nós sabemos que fazer estas modificações, neste
caso, têm um custo que a curto prazo é muito menor do que a médio ou a longo
prazo – e portanto a intervenção é premente, é urgente – mas esta questão dos
comportamentos ambientais aliados também sobretudo à dependência enorme do
petróleo, do carvão mineral e do gás natural e sobretudo também para o custo
das infraestruturas para energias renováveis como é por exemplo a energia
mar-motriz, fez o Grupo Castanho reflectir sobre este assunto.
Jorge Moreira da Silva
Eu agora vou ter de ser mais
rápido. Não é falta de respeito pelos Grupos que seguem, mas como também uma
parte das respostas já foram dadas…
Coloca uma questão importante: a
capacidade da Europa de concretizar os seus objectivos. Muitas vezes somos
induzidos pela ideia de facilidade na concretização dos objectivos e antes de
chegar a 2050, olhar só para 2020. A meta de 20% de redução de consumo de
energia em 2020 ou a meta de 20% de renováveis em 2020, na Europa, é tudo menos
fácil de atingir sem uma alteração significativa de políticas europeias e
nacionais. Muitas vezes, nós terminamos o escrutínio e a avaliação com a
aprovação de um plano. "Ah, a Europa já aprovou o Plano 20-20-20, pronto, está
feito”. Não, não está feito. Porque a tendência é oposta. Dando um número
concreto: a Europa assumiu uma redução do seu consumo de energia em 20% até
2020 e numa visão mais larga uma redução da sua dependência energética que hoje
está e cerca de 50% ou 60%, mas o padrão, o business
as usual, aquilo que acontecerá se não fizermos nada, é um agravamento da
dependência do exterior, do petróleo, do gás natura e por aí adiante.
Portanto se olharmos para as
condições objectivas da Europa, da sua política energética e não olharmos para
as metas, se deixarmos as coisas irem livremente, sem regulação, a tendência é
de um agravamento do fosso em relação aos objectivos ambientais mais
ambiciosos. Portanto, a tendência da Europa de dependência energética do
exterior, a tendência da Europa de consumo de energia é de crescimento
exponencial de consumo de energia e de crescimento exponencial de dependência
energética do exterior. Essas são as tendências.
Se olhar para a curva dos próximos
dez anos, dos últimos dez anos e as estimativas dos próximos dez, é isso; em
cima disso, colocou-se metas de 20%, de 20-20-20. Eu queria enfatizar a ideia
de que essas metas por si só não valem nada. É necessário que os Estados e a
Europa tenham políticas que sejam compatíveis com essas metas. Portanto,
concordo com o que diz em relação à dependência com o exterior e espero que a
Europa possa dar um salto na comunitarização de algumas políticas.
Hoje, nós já temos algumas áreas
da política energética que têm soluções comuns e coordenadas, mas eu defendo um
aprofundamento da política energética europeia que não se limite à questão das
renováveis e às metas para a eficiência energética. A Europa é uma vantagem,
logo, a Europa que tem sido lesta em definir metas, deve encontrar novas
directivas que facilitem a vida aos Estados para a coordenação comum e
coordenada dessas metas. «A união faz a força». E se, enquanto que, em relação
à redução de emissões está provado que a «a união faz a força» e que o sistema
europeu de comércio de emissões consegue mais facilmente atingir objectivos do
que 27 políticas nacionais diferentes, o mesmo acontece para a política
energética. Eu defendo uma política fiscal; uma fiscalidade energética comum;
eu defendo, cada vez mais, uma reconversão das políticas de segurança de
abastecimento na Europa para que sejam atendidos os níveis de redundância. O
que é que eu quero dizer com isto? Nós não precisamos de ter um stock de
petróleo tão elevado em Portugal, ou um stock tão elevado para garantir a
segurança de abastecimento porque eu sei que Espanha também tem um stock,
França também tem um stock, logo, se nós pudermos definir uma política mais
comum e mais coordenada para a segurança de abastecimento, provavelmente, não
precisamos de armazenar, ter tantos stocks de combustíveis fósseis, porque
podemos fazer uma gestão mais integrada.
Portanto, eu acho que é um dos
debates que eu espero que a Europa possa vir a fazer, que é do aprofundamento
da sua política energética porque disso depende, em larga escala, a sua
política de vizinhança e a própria geopolítica.
Quanto aos objectivos de 2050 é
como disse: estamos a falar de 70 a 90% de redução das emissões na Europa até
2050, o que se traduz em termos praticamente 100% de Energias Renováveis até
2050.
Estamos a falar de termos de
encontrar tecnologias, políticas, mecanismos de financiamento, remoção de
barreiras à penetração dessas tecnologias de modo a até 2050 termos renováveis
em 100% na produção de electricidade nomeadamente e termos nos Transportes –
que ainda não tinha referido, é o sector que mais me preocupa; é onde as
emissões estão a crescer a um ritmo mais elevado, seja na Europa, seja em
Portugal e não é possível termos uma política de Energia que não pense os
Transportes. Essa é a minha irritação, se quiserem, quando se fala de Energia:
é que fala-se de Energia numa caixinha e de Transporte noutra caixinha.
Ora, a política de Transportes
está totalmente ligada à política de Energia e a nossa dependência energética
do exterior, Europa e Portugal, está quase exclusivamente ligada à nossa
política de Transportes porque não é uma política de mobilidade. Nós
continuamos a pensar em Transportes, em Portugal e na Europa em geral, como
infraestruturação de Transportes; construção civil nos Transportes, redes de
infraestruturação nos Transportes e não pensamos nos Transportes numa
perspectiva de mobilidade sustentável e de sistemas de mobilidade que só depois
determinem a infraestruturação. O que temos é o contrário, infelizmente. Temos
muita infraestruturação e poucas políticas e o que eu considero que nós
precisamos é de políticas de mobilidade e não o contrário.
Nuno Matias
Tem
agora a palavra o Grupo Azul através do João Santos.
João Santos
Muito bom dia a todos. Senhor Eng.
Jorge Silva, pensa que o actual modelo de ordenamento de território está de
certo modo de acordo com uma política de sustentabilidade energética e
ambiental?
Dou um exemplo: a Serra da Malcata
tem um cariz, ou teve, essencialmente natural, mas hoje em dia é mais um parque
eólico.
Muito
obrigado.
Jorge Moreira da Silva
Deixe-me aproveitar a sua pergunta
para falar de Ordenamento de Território, porque é a primeira pergunta de
Ordenamento de Território e se eu tivesse de escolher uma prioridade na área do
Ambiente, para além das alterações climáticas, mas que apesar de tudo já existe
um contexto europeu global sobre este tema, é o Ordenamento de Território.
O Ordenamento de Território é uma
das poucas políticas na área do ambiente que não está comunitarizada, portanto
não há praticamente directivas comunitárias sobre o Ordenamento do Território,
é considerado matéria de decisão exclusiva nacional.
Ora, nós em Portugal vivemos,
penso eu, uma situação anacrónica na área do Ordenamento do Território, porque
se por um lado é verdade aquilo que muitos estudos dizem, que o nosso
Ordenamento do Território é muito complexo e burocrático, até sinuoso, existe
um emaranhado tão grande de regras que prejudica a nossa competitividade,
também é verdade que a forma de ultrapassar esse emaranhado de regras, essa
burocracia e essa forma complexa de ocuparmos o território é tudo menos
eficiente e até transparente.
Isto é, hoje temos muitos planos,
mas mau planeamento. Podemos ter na mesma zona sete ou oito planos, uns em cima
dos outros. Aqui na zona do Nuno, na zona da Arrábida, temos por exemplo numa
determinada zona de Almada o PDM, pode haver o Plano Pormenor e em cima desses
o Plano de Ordenamento da Área Costeira, depois há o Plano da Área Protegida da
Arrábida, o Plano Sectorial da Rede Natura e pode haver também, se estivermos
numa zona com bacias hidrográficas, Plano especial de bacia hidrográfica.
O problema é que eles não
comunicam entre si e eu hoje altero um plano e essa alteração não é
automaticamente acomodada nos outros planos. Existem por isso contradições e é
no meio delas que muitas vezes florescem fenómenos de corrupção, ou também se
impede o desenvolvimento. No emaranhado das regras, na falta de compatibilização
das regras, na falta de comunicabilidade perdemos sempre. Perdem aqueles que
fazem bem, com sentido ético, com sentido ambiental, porque essas regras
prejudicam a competitividade e perde o Estado também, porque é no meio dessas
regras e incongruências alguns tiram benefícios ilegítimos das alterações do
uso do solo.
O que foi institucionalizado pelo
anterior Governo foi batota, que é uma via verde para facilitar uma série de
processos na área do Ordenamento do Território. Por exemplo, quero fazer um hotel
num sítio que o PDM, o Plano de Ordenamento da Orla Costeira, o Plano Sectorial
da Rede Natura diz que eu não posso.
O que é que seria normal? Se faz
sentido que se faça uma alteração dos planos, faça-se uma alteração dos planos.
O que é que foi decidido pelo anterior Governo? Aprova-se o PIN, leva-se ao
Conselho de Ministros a suspensão do PDM, para não violarmos a Lei, aprova-se o
projecto, o PDM está suspenso, o projecto está aprovado, volta a vigorar o PDM.
Portanto, é uma ilegalidade homologada em Conselho de Ministros, sem
participação pública. Enquanto se faz um Plano de Ordenamento onde há discussão
pública, quando se trata de PIN basta uma decisão administrativa de um membro
do Governo para considerar aquele plano muito importante para a Economia para,
de acordo com o anterior Governo, não este Governo, esse plano de ser
ultrapassado sem qualquer discussão pública, sem qualquer ponderação ambiental
ou de outra ordem. Portanto, há uma sobreposição das questões económicas às
questões ambientais. Essa não pode ser a solução.
Qual é que poderia ser a solução? Aquilo que está no nosso programa
eleitoral e presumo que no Programa de Governo é uma reforma do Ordenamento do
Território de forma a haver um interlocutor único perante os cidadãos e perante
as Autarquias. Isto é, enquanto eu hoje quero licenciar uma determinada
estrutura, tenho que percorrer várias capelinhas na Administração Central e
Administração Local, o modelo que defendemos é o de haver um interlocutor
único. Há uma entidade que é responsável na relação com o Cidadão e o
Ordenamento do Território e o mesmo entre o município e a Administração
Central; portanto há uma maior responsabilidade e menor envolvimento dos vários
sectores. Há uma menor utilização dos pareceres vinculativos e isso permite uma
maior responsabilização deste processo. Mas há uma outra reforma que é
necessário fazer e esta sim, relacionada com a sua questão, que tem a ver com
os benefícios económicos da Biodiversidade. Alguém que esteja na Serra da
Malcata, tenha um terreno na Serra da Malcata, Rede Natura "não pode fazer
nada”, portanto, perde economicamente. A mudança que é preciso fazer é: passar
a autorizar? Não. Depende, mas não deve ser por haver um prejuízo económico na
protecção de um bem que ambientalmente se considera válido que se deve
subverter as regras; o que se deve é remunerar aqueles que trabalham na
conservação da Natureza. Em vez de, para si, ter um ónus ou um terreno onde não
pode fazer nada e não tem nenhum incentivo para o conservar ou proteger aquelas
espécies, tem de começar a haver uma compensação (é o que eu defendo, é a
título pessoal como é óbvio) para que aqueles que desenvolvem essas actividades
tenham um incentivo a proteger esse território e não um ónus por não fazerem
nada. Isso pressupõe uma perequação nacional. Eu que vivo em Lisboa tenho
vantagem que o meu caro amigo que vive na Malcata conserve o seu território,
porquê? Porque há um benefício ambiental global e nacional dessa protecção, mas
isso pressupõe que eu tenha numa cidade que compensar aqueles que no Interior
realizarão essa actividade, caso contrário perdemos todos, porque há uma maior
desertificação do Interior, há uma fuga do mundo rural, há uma degradação do
mundo urbano, há uma crescente suburbanização das cidades, portanto, o país
perde no seu todo.
Nuno Matias
Grupo
Rosa, Hugo Gonçalves.
Hugo Gonçalves
Bom dia a todos. Queria em
primeiro lugar, em nome do Grupo Rosa, agradecer ao Eng. Jorge Moreira da Silva
a excelente intervenção que tem feito até agora.
A nossa pergunta vai um pouco de
encontro àquilo que estava a falar há pouco da Economia energética, de
economizar o gasto energético. Como nos poderemos consciencializar a todos a
economizar até em casa, tendo em conta que corremos o risco que a Humanidade
como a conhecemos hoje pode acabar amanhã?
Obrigado.
Jorge Moreira da Silva
Eu gostava de introduzir aqui uma
questão de que ainda não falei ligada à reorientação de comportamentos que é a
pergunta que fez.
A reorientação de comportamentos
no fundo é o papel de cada um de nós deve ter na redução do consumo de energia,
porque essa redução do consumo de energia tem um benefício económico para mim:
se consumo menos energia, tenho uma factura energética mais baixa; se consumo
menos energia, à escala nacional, o país vai ter uma menor dependência
energética exterior, isto é, deixamos de ter uma balança comercial tão
desequilibrada. Mas há também uma vantagem, se quiser, do ponto de vista
económico, porque uma redução do consumo de energia permite canalizar, isso não
tem sido muito falado, recursos de umas áreas para outras. Aquilo que estamos a
gastar na Energia, degradando, desbaratando, deitando pela janela fora, são
recursos que podemos voltar a investir nomeadamente na Agricultura que é um
sector cada vez mais estratégico onde o País não pode deixar de ganhar a
vantagem da competitividade. Mas para isso é necessário que sejam dados sinais
por parte do legislador e decisor político de reorientação de comportamentos.
Isso pressupõe uma mexida na fiscalidade. Eu – mais uma vez; isto são as regras
desta Universidade – falo a título exclusivamente pessoal, eu defendo um choque
fiscal verde, há muito tempo que o defendo, que passa de uma forma gradual e
pensando isto numa perspectiva de médio e longo prazo, cada vez mais substituir
impostos sobre o trabalho e sobre a riqueza que as empresas produzem por
impostos ambientais. Pensando num quadro de neutralidade fiscal, não há aumento
de impostos em termos globais, mas prefiro, defendo, advogo fortemente, uma
maior penalização da poluição e uma menor penalização do trabalho (que é uma
coisa boa), uma maior penalização da degradação dos recursos naturais e uma
menor penalização, via fiscal, da produção de riqueza nas empresas (que também
é uma coisa boa).
Portanto, eu espero que seja
possível à escala europeia e também nacional, que possa haver uma reforma
fiscal ambiental de largo espectro ao nível do património, fomentando e dando
sinais para a regeneração urbana, para a requalificação, para a penalização
daqueles que degradam, daqueles que abandonam, daqueles que não requalificam;
que possa haver uma alteração fiscal nos produtos energéticos, que possa haver
uma alteração fiscal nas tecnologias limpas da área da energia, que possa haver
uma alteração fiscal na área florestal e que possa no fundo também na área das
alterações climáticas, a nível do CO2, ser dado um sinal de
reorientação de comportamentos.
Eu dei no outro dia um exemplo
prático que é: nós podemos encontrar tantas receitas numa taxa de CO2sobre os sectores que não estão no comércio de emissões, mas também envolvendo
uma parte daqueles que estão no comércio de emissões e não têm metas muito
ambiciosas, do que alguns cortes que se possam fazer na Administração Pública
ou alguns novos impostos que possam ser lançados.
Portanto, eu defendo muito a introdução de impostos ambientais a favor
da diminuição de outros impostos e isso é um factor essencial à reorientação de
comportamentos. Aconteceu na Califórnia, houve um apagão na Califórnia há sete
ou oito anos atrás porque havia um consumo excessivo de energia e o governo dos
Estados Unidos lançou um imposto sobre o consumo de energia e o consumo caiu e
caiu a sério. Há uma sensibilidade do consumo de energia em relação às
políticas fiscais. Vamos penalizar as pessoas? Não, porquê? Porque está provado
que todos nós temos condições de reduzir o nosso consumo de energia em 30% a
40% sem perdermos qualidade de vida. Portanto, há uma margem elevada de 30% a
40%, no Estado isso ainda é mais elevado, em que nós podemos reduzir o consumo
sem perder nada: não perdemos qualidade de vida, não perdemos mobilidade e
ganhamos dinheiro, mas para isso os incentivos fiscais são importantes.
Nuno Matias
Muito obrigado. Pelo Grupo Laranja,
a Vera Artilheiro.
Vera Artilheiro
Bom dia a todos.
Coube-me a mim a honra de encerrar
esta primeira ronda de questões. Quero agradecer-lhe não só em nome do Grupo
Laranja, como creio que posso agradecer em nome de todos, a excelente exposição
que nos trouxe aqui, que acho que foi uma excelente forma de iniciarmos as
aulas na Universidade de Verão.
Não abordou aqui a questão do
petróleo muito embora seja um dos principais responsáveis pelas emissões de CO2.
Estima-se que até 2015 seja atingido o pico do petróleo mundial e que com isto
dar-se-á o fim do petróleo barato. Isto significa que os custos de extracção do
petróleo irão aumentar, poderá ter também outras implicações que poderão
originar a dissolução da Economia Global com o completo colapso das sociedades
industrializadas.
Até que ponto considera que a
Economia Mundial irá conseguir subsistir e que caminhos alternativos deveríamos
traçar?
Obrigada.
Jorge Moreira da Silva
Sobre o petróleo, isso é tanto
mais grave quanto se olhar para a situação nacional, porque Portugal é, como
disse, a seguir ao Luxemburgo, o país com maior dependência energética do
exterior (na casa dos 80%, 85%), por isso é que aqueles que estiverem a olhar
para a energia só como electricidade estão a falar de uma falácia.
Portanto, 80% de dependência
energética do exterior, sendo que 60% da dependência é petróleo. Sempre que o
petróleo aumenta um euro, o barril de Brent aumenta um dólar, em Portugal isso
tem um efeito três vezes superior à média europeia. Reparem que a nossa adicção
no petróleo é um dos principais factores do empobrecimento da nossa Economia.
Sempre que aumenta um dólar, cá, pesa três vezes mais porque nós somos mais
dependentes energeticamente do exterior. Não há aqui volta a dar: o petróleo é
um dos grandes responsáveis pelo aquecimento global; a nossa dependência do
petróleo empobrece a nossa economia; e o barril do petróleo, a tendência é de
aumentar.
Se olharmos para a escala global,
para a escala do tempo, para todos os estudos que são feitos, aqueles que
continuarem a apostar numa política energética assente no petróleo e numa
economia assente no petróleo perdem três vezes: mais CO2,
penalizados pelo preço CO2, maior dependência da economia em relação
ao petróleo, três vezes maior sensibilidade sempre que o preço aumente; por
outro lado maior dependência do petróleo, menos recursos alocados a áreas
tecnológicas emergentes.
Um país como Portugal não tem
volta a dar, é daqueles para os quais a decisão é simples: uma das nossas
decisões mais importantes terá de ser a redução da nossa dependência do
exterior e uma redução da nossa dependência em especial do petróleo e isso não
pode ser feito sem uma nova política para os transportes e sem incentivos
adequados à indústria. E cada um de nós em nossas casas e no sistema de
mobilidade, para que o possamos fazer; se não fizermos isso, continuamos a
olhar para a energia como se fosse só electricidade, continuamos a olhar para o
petróleo como se fosse uma commodity, como
ouro ou algum tipo de minério – o petróleo não é uma commodity apenas, o petróleo é uma das grandes razões da degradação
da nossa Economia e do empobrecimento de Portugal -, portanto se quiserem um
desígnio, um dos nossos desígnios é o de aproveitar a política para as
alterações climáticas para matar três coelhos de uma só cajadada, que é:
reduzir as emissões, reduzir a nossa dependência energética do exterior e
desenvolver a nossa Economia, porque os recursos que vão para o petróleo podem
ir mais facilmente para outras áreas de desenvolvimento tecnológico.
Dep.Carlos Coelho
Muito bem, chegámos ao fim da aula
"Ambiente e Energia: o que temos de decidir já”.
De acordo com uma tradição antiga
vamos acompanhar o nosso convidado à saída, para que o nosso Diretor-adjunto,
Nuno Matias, e os avaliadores possam prosseguir os nossos trabalhos.
Em nome de toda a Universidade de
Verão, muito obrigado ao Eng. Jorge Moreira da Silva.